Aladino e a Aldeia dos Núbios

O TERMÓMETRO MARCA QUARENTA E TRÊS graus Celsius e ainda não devem ser dez da manhã neste lugar escondido do resto do mundo, onde o Sol é soberano.

Na aldeia núbia, de uma só rua e algumas perpendiculares, a economia depende essencialmente do que os homens vendem nas suas bancas: tapetes étnicos feitos em tear, essências aromáticas, rosas-de-Jericó, jóias, pedras preciosas, colares exóticos inspirados na joalharia faraónica, estátuas de divindades egípcias, chás, incensos perfumados, remédios naturais, galabias para vestir, lápis kajal para aquele misterioso e sedutor olhar delineado do Médio Oriente. Todas as tentações e tesouros que a imaginação poderia reunir, num só lugar.

A Núbia é uma região no nordeste africano que se estende ao longo do rio Nilo, no sul do Egipto e no Sudão, berço de um grupo étnico indígena antiquíssimo que perdura aqui há mais de sete mil anos — os Núbios.

Aladino (you are very famous now!)
Foi numa destas bancas, digna d'«As Mil e Uma Noites» e da lenda de Aladino, que este diálogo, tal como transcrevo, sucedeu:

— Welcome, Madam! Where are you from?
— Thank you. I’m from Portugal.
— What’s your name?
— Hazel, and yours?
— I’m Aladino. Nice to meet you.
— Aladino? Really? What a beautiful name!


Aladino, trinta e oito anos, num inglês muito educado e correcto, contou piadas, fez trocadilhos e charadas idiomáticas. Ao longo do tempo ficámos amigos, ficámos irmãos. De pais e países diferentes, mas a mesma afeição pelas histórias e pelas palavras.

«Tenho a sensação de estar num país dentro de outro país. Existe vigilância e policiamento com metralhadoras no resto do Egipto, mas aqui não vi um único polícia. Porquê?», indaguei, em inglês. Aladino sorriu com bondade e respondeu: 

«Porque não precisamos.»

Sentámo-nos no chão abrigados do Sol que me incinerava a pele e os cabelos, sob um céu feito de panos, e a conversa prosseguiu com chá de menta oferecido em taças redondas de porcelana.

Os crocodilos são mantidos em tanques no exterior das habitações como animais de estimação, mantidos com muito carinho. Quando morrem, são secos e pendurados em paredes.

DENTRO DA ALDEIA
Os núbios raramente vivem sozinhos ou só em casal. O mesmo tecto costuma albergar várias gerações.

Há uma reverência sagrada pelos anciãos, cujas palavras são escutadas pelos mais novos com o respeito de quem ouve, através da sua boca, os ecos das vozes oraculares de toda uma linhagem de ancestrais. Os jovens servem os idosos com a mesma honra e sacralidade que se serviria um deus vivo –, porque o Tempo é a divindade suprema.

As tradições, mais valiosas que qualquer bem material, são a sua preciosa herança, e o costume da comunidade reunir-se em cículo para partilhar histórias, poesia e música são o respirar de um deus vivo cujo corpo é feito da soma de todos os núbios.

Têm uma forte vivência mística que cultiva a fé no poder dos antepassados e dos espíritos, a quem prestam culto em rituais e cerimónias espirituais para honrar os ancestrais e pedir a sua protecção e orientação.

Os núbios são dos povos mais honrados do mundo. Não há criminalidade, mesmo em fases de escassez. Um núbio não rouba, não mente, não engana. Se um membro da comunidade estiver a passar por dificuldades económicas, nunca é tratado como se fosse “menos importante”. Sempre haverá um vizinho que lhe estende a mão:

«Precisas, aqui tens. 
Se um dia eu precisar, 
sei que também me ajudarás», explica Aladino.

Têm uma organização própria que consiste em tomarem as decisões para a comunidade baseadas no consenso e benefício de todos os seus membros. O dinheiro tem, assim, uma importância relativa. 

[Incrédula por conhecer alguém realmente chamado Aladino, sinto-me perante o verdadeiro herói de um dos contos d'«As Mil e Uma Noites»! —, o primeiro livro de literatura para adultos que li quando criança, pelo qual me apaixonei para toda a vida. No conto, Aladino era um jovem astuto que tinha descoberto a Lâmpada Mágica de onde saía um génio disposto a satisfazer os seus desejos.]

O deserto e o Rio Nilo ao fim do dia.

O Sol mergulha para lá das dunas enquanto os vendedores caminham com pacatez para casa, deixando as bancas cheias de tesouros valiosos nas ruas agora vazias, entregues ao silêncio e ao pó do deserto.

Se no resto do Egipto a História é um defunto que jaz lado a lado com as múmias em decomposição nos museus e no silêncio sepulcral das pirâmides vazias –, aqui não existe pretérito-perfeito: a História está viva! E cada homem e mulher núbia é uma das suas páginas.


AS MISTERIOSAS MULHERES NÚBIAS
As mulheres costumam cuidar das tarefas domésticas e dos filhos, enquanto os homens saem para trabalhar. 

Desengane-se quem as toma por submissas ao patriarcado. Longe disso: elas ficam em casa, mas os maridos têm que prestar contas e entregar o dinheiro que ganham, para que elas que decidam como geri-lo.

Cada mulher caminha com altivez e dignidade imperial, achando-se a melhor do mundo em tudo, a mais bonita, a mais talentosa, a mais especial. Independentemente de ser nova, velha, alta, baixa, gorda, magra, bonita ou desengraçada. Possuem a auto-estima inabalável de uma rainha. 

Não existe rivalidade entre mulheres, mas uma verdadeira sororidade. Elas não se misturam com os homens nos eventos sociais nem quando saem à rua.


OS CASAMENTOS NA ALDEIA
A celebração de um casamento núbio tem aqui a duração de três dias: o dia da festa da noiva, o dia da festa do noivo, e o dia da festa do casal. Até nos casamentos as mulheres e os homens socializam em áreas distintas. 

Toda a comunidade é convidada para as festas de casamento, incluindo forasteiros e certas escribas que possam ter sido bafejadas pela sorte por estar no-local-certo-à-hora-certa (não sabendo onde me posicionar, pois as mulheres são muito unidas entre si mas pouco receptivas a estrangeiras, fiquei na linha equatorial da sala de festas).


«O Nilo é a nossa mãe e o nosso pai.»
Ditado núbio

O busto de Nefertiti, obra-prima da arte egípcia antiga, admirado pelas linhas elegantes, expressão serena e traços delicados, é um ícone da beleza e da feminilidade e um dos principais símbolos da cultura egípcia.

NEFERTITI
Existe uma forte ligação com o rio Nilo, a principal fonte de vida e de subsistência. Muitos dos costumes e tradições são em torno do Nilo.

Especula-se que aqui terá nascido Nefertiti, a rainha (supostamente) núbia cuja beleza ficou para sempre na memória colectiva. O seu nome significa, em egípcio antigo, «chegou aquela que é bela».

CÓDIGO DE HONRA
Sem dúvida, a Núbia é a região mais especial e mágica deste país. Um local fora do tempo, onde cada habitante transporta a paz do deserto e a sabedoria de milhares de anos.

Nunca esquecerei e partilho a advertência: os núbios levam MUITO a sério a palavra. É sagrada. Um núbio transporta consigo o legado de um código de honra com o peso de sete mil anos, que o equipara quase a um semideus entre mortais. 

Quando alguém diz «logo se vê», ou qualquer outra afirmação semelhante, mesmo proferida com leveza e descompromisso, para um núbio tem a força e a validade de um contrato assinado: DEVE ser cumprido. Jamais engane nem crie falsas ilusões a um núbio. Há um ano, prometi-lhes que iria um dia escrever sobre esta comunidade. Promessa concretizada. Insha'Allah! 

Termino com um agradecimento especial a Aladino, desejando que a tradução automática para inglês não fuja muito do texto original.

Com os ventos do deserto,

Hazel
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NOTA: Todas as fotos e vídeos são meus, excepto a foto da Nefertiti (licença CC0).
 

Viagem à Terra do Diabo — Parte 2

← Continuação da crónica anterior: Viagem à Terra do Diabo – Parte 1

OS PÉS DA VOSSA ESCRIBA avançam pela penumbra das ruas antigas. Perante os seus olhos emerge a ponta reluzente do pirilau do Cabrão (Diabo). 

A aldeia é decorada com pentáculos (estrela de cinco pontas que representa o equilíbrio dos elementos: água, fogo, terra, ar, éter).

O aroma reconfortante das castanhas assadas trepa pelas ruas 
em braços de fumo ondulantes e convidativos.

Vinhais, terra do Diabo, é também terra de castanheiros, árvore sagrada para os Druidas, símbolo de perseverança e abundância. 

No Outono transbordam ouriços e castanhas caídos das árvores junto às estradas que serpenteiam pelas serras. A vossa escriba não resistiu e trouxe alguns sacos com castanhas. Para investigação, claro está.

A festa é por ali, entrem à vontade — indica-nos um homem que enverga uma capa escarlate e chifres protuberantes com a admirável autoridade, naturalidade e satisfação de quem finalmente pode vestir aquilo que lhe apetece sem ter de lidar com julgamentos.

O ritmo folgazão dos bombos e gaitas-de-foles ecoa pelas encostas, rasgando o silêncio montanhoso à volta da aldeia de Cidões, num ritual que redesperta os velhos deuses telúricos do profundo sono secular.

O Canhoto.

A pilha de ramos e troncos reunida pela população arde no centro da aldeia, pronta para queimar o Cabrão no fim da festa. Ao lado, é cozinhada a Cabra, a sua mulher, em caldeirões. Diz a tradição que a lenha não arde se não tiver sido roubada. 

Os músicos e saltimbancos tocam e dançam à volta da fogueira, em torno da qual caminhamos no sentido anti horário para desfazer os males, e no sentido horário para trazer a abundância.

Aquecem-se os ânimos com o Ulhaque, bebida espirituosa de origem Celta, típica de Cidões. Contém bagaço, medronhos, infusão de ervas e outros ingredientes secretos, extraídos das encostas do Rio Tuela. É degustado gelado e promete ter um fino sabor. Digo “promete” porque não cheguei a provar, oh que diabo!

A poção do Druida.

Acompanhado pelas três faces da Deusa Tríplice (Mãe, Donzela e Anciã), o Druida esconjura a má sorte, os malefícios e o mau-olhado. 

Com o fogo como ingrediente principal, dentro e fora do caldeirão, prepara a Queimada, uma poção mágica de limpeza e protecção para o corajoso que a beber.

A chegada do Diabo. 

Este magano que dizem esconder-se atrás das portas, chega ataviado a rigor, fazendo-se transportar com grande alarido num carro de bois puxado por homens. 

Lança o terror sobre a população, representando assim os medos, a escuridão, as dificuldades da vida e a submissão do homem aos vícios e instintos.

Trava–se uma batalha entre o Druida e o Diabo, numa encenação do eterno conflito entre Bem e Mal, Luz e Trevas, Verão e Inverno. O confronto das polaridades gera o caos. E do caos renasce a harmonia e o equilíbrio universal.

Ao longo da noite, seguindo os diabólicos velhos costumes, os rapazes jovens roubam os vasos de flores que enfeitam as casas, rodam as cadeiras de pernas para o ar, desarrumam tudo e viram a aldeia do avesso.

As lendas do passado são-nos teatralizadas pelos próprios filhos da terra para que não sejam esquecidas. Devemos prestar toda a atenção, são as últimas vozes das almas antigas que ecoam. 

Festa da Cabra e do Canhoto marca a época do fim das colheitas, 
o término do ano velho e o início do ano novo pagão. 

A egrégora de velhos deuses pré-cristãos cultuados neste ritual ancestral, em tão remota e discreta aldeia tem as suas raízes deveras bem entranhadas na terra. 

Assim como os castanheiros, que proliferam na região, parecem ser divinamente protegidos resistindo às intempéries ao longo dos anos, também as divindades pagãs encontraram forma de se manter vivas e de resistir aos ventos inquisitórios que varreram da memória colectiva o culto da Terra-mãe.

Acredito que enquanto houver fumo de castanhas assadas no fim dos Outonos, regozijam-se os Deuses e os genii loci (os espíritos do lugar), proporcionando-nos estes, em retribuição, um Pequeno Verão dentro da estação fria e chuvosa.

O sensor-hiper-sensível da vossa escriba concluiu que há algo de muito especial e impossível de traduzir por palavras acerca da Aldeia de Cidões

O local parece ter uma Consciência per se, inteligente, activa, astuta, que é nutrida pela população, e que a nutre de volta, não deixando que morra a aldeia, os costumes, a coesão — e, em última análise, a Consciência, para onde tudo retorna.

O Cabrão.

Atirando com as botas de investigação por cima da cabeça, dou por concluída a diabólica jornada respondendo a algumas dúvidas que recebi por telepatia:

Onde fica Cidões?
Cidões é uma pequena aldeia de dezoito habitantes que pertence ao município de Vinhais, Bragança, região de Trás-Os-Montes.

Quantos quilómetros de Lisboa a Cidões?
Cerca de 500 quilómetros.

E do Porto a Cidões?
Cerca de 220 quilómetros.

E de Faro a Cidões?
Cerca de 730 quilómetros.

Vale a pena ir lá?
Hell yes. Sem dúvida que, pelo menos uma vez na vida, vale a pena ir à “Terra do Diabo”. Nada é o que imaginamos encontrar. Esta é uma experiência que devemos vivenciar procurando sentir e compreender o significado subliminar de tudo, sem nos condicionarmos pelas aparências ou pelo preconceito. É um testemunho histórico irrefutável e um privilégio imenso fazer parte desta viagem no tempo.

O Diabo existe?
Certamente que sim. O Diabo é tão real quanto as emoções sombrias do ser humano; quanto a força opositora que mantém vivo o fluxo do Universo. O Diabo é a mais crua e autêntica alegoria criada pelo Homem.

Deus vai castigar-me se eu for à Festa da Cabra e do Canhoto?
Vai. Deus nos livre dos seus seguidores. A Festa da Cabra e do Canhoto é para pessoas não-chatas, que não têm medo de sorrir, de se divertir, de Viver. 

A poção “Queimada” do Druida, é mesmo mágica?
A vossa escriba investigou profundamente (até ao fundo da caneca de barro, bem-entendido), e afiança-vos que faz ficar com a voz mais grossa e o álcool etílico passa a parecer uma bebida para bebés. 

Paga-se entrada?
A entrada é livre. As bebidas e petiscos são justa e merecidamente pagos.

Quando haverá a próxima Festa da Cabra e do Canhoto?
Na Noite das Bruxas, 31 de Outubro.

Links úteis:

💚 Agradeço ao Luís Castanheira, organizador da Festa, referido na Parte 1 desta crónica-em-dois-capítulos, pelo caloroso acolhimento e pelo simpático e divertido convite para ajudarmos a acender as velas da festa na ponte de Cidões. 

Nas labaredas do Diabo,

Hazel
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Viagem à Terra do Diabo — Parte 1

A TERRA DO DIABO fica muito longe, para lá dos montes. Poucos ousam ir lá, menos são os que sabem da sua existência, e mais raros os que lá moram.

Diz a lenda que uma vez por ano, na noite de 31 de Outubro, o Diabo anda à solta numa pacata e remota aldeia nortenha. Tudo fica virado do avesso. 

Celebram nessa noite a Festa da Cabra e do Canhoto, uma tradição pagã antiquíssima que sobrevive há mais de dois mil anos, o aclamado genuíno Samhain (Halloween) português, passando praticamente despercebido pelo resto do país.

Que inquietante tradição é esta, cheia de rituais misteriosos, onde a personagem principal é o Cabrão, bebe-se uma poção flamejante feita pelo Druida no caldeirão onde se esconjura o mau-olhado e afasta as trevas, e a lenha só arde se for roubada? E que diabo é isso do Canhoto? 

A vossa escriba, que nunca testemunhou este relicário vivo do misticismo antigo, vestiu a capa preta de investigação, botas altas e lupa, e foi indagar que coisas fixes se fazem para lá dos montes, que é como quem diz, em Cidões, Município de Vinhais, Trás-Os-Montes. Sobrevivi ao encontro com o Diabo e voltei para contar a história:

Chegámos duas horas antes da festa começar. Cidões é uma pequena aldeia silenciosa com casas de pedra adornadas com inúmeros vasinhos de flores, perdida na imensidão verdejante das serras. Tem apenas dezoito habitantes.

O Cabrão

Estava previsto chuva forte e trovoada, no entanto a força dos elementos tem as suas próprias vontades que andam de mão dada com a população, e o clima esteve inexplicavelmente ameno.

O Cabrão, colocado na entrada, dá as boas-vindas em todo o seu esplendor. [Sempre quis ter uma desculpa para escrever isto numa crónica e sair impune, oube lá. 😃] 

A imponente escultura de madeira com sete metros é queimada (pirilau incluído) ritualisticamente na enorme fogueira — o Canhoto — juntamente com a má sorte, o mau olhado e as dificuldades. Diz a lenda que esta lenha só arde se tiver sido roubada.

Marca-se, assim, a celebração do fim do ciclo agrário, despedindo-nos da metade clara do ano e entrando na metade escura e nas noites longas e frias. 


Os caldeirões cozinham a Cabra, mulher do Cabrão, dizem eles, enquanto repetem o antigo adágio que aprenderam com os seus avós: 

«Quem da Cabra comer e ao Canhoto se aquecer, 
um ano de muita sorte vai ter.»

Resolvemos sair da aldeia e respeitar o espaço e a privacidade dos cidanenses para se organizarem ao seu jeito sem se sentirem observados por dois forasteiros. Forasteiros, escrevi eu? Estava prestes a aprender a primeira grande lição desta incursão: No Norte, nunca é forasteiro aquele que vem por bem. É da terra também.

Travou repentinamente um carro ao nosso lado. A janela desceu:
— Andais perdidos?
— Estamos só a passear, viemos para a festa.
— Querem vir comigo ajudar a acender velas na ponte?

De um momento para o outro, com o Sol a morrer para dar lugar ao lusco-fusco, deslizámos para dentro do carro do desconhecido de olhos vivos e resplandecentes como os de uma criança. Havia um cajado com o que pareceu ser a cabeça do Diabo no banco de trás, assim como uma boa quantidade de velas vermelhas. Ele há horas do Diabo.

O Luís, é o seu nome, conduzia apressadamente pelas curvas e contracurvas que conhece desde que nasceu, e conversava como se nos conhecesse desde sempre. 

Contou que a festa é organizada por um grupo de amadores entusiásticos, filhos da terra, descendentes das gerações pagãs que ali habitaram. Não têm patrocínios, preferem preservar a identidade e a tradição. 

Unem-se esforços e dos seus próprios bolsos, com simplicidade e amor, compram tudo para proporcionar a quem visitar a aldeia nesta noite, uma celebração acolhedora e inesquecível, à boa e hospitaleira maneira do Norte.

Acendemos as velas vermelhas e distribuímo-las dos dois lados ao longo da pequena ponte que dá acesso a Cidões.

— Logo quando chegar a meia-noite venham aqui para o meio da ponte. Deixem-se ficar de pé, fechem os olhos e fiquem a sentir uma presença, uma energia, aqui com esta natureza toda à volta. Depois irão perceber. Façam as vossas preces e lancem os vossos pedidos ao rio.

Na voz do Luís, que não precisou de dar mais explicações, vinham as vozes de todos os antepassados que há mais séculos do que conseguimos sequer imaginar, dão continuidade a este misterioso ritual na ponte que liga Cidões ao resto do país, da mesma forma que o mundo terreno se liga ao mundo sobrenatural.

Eis que chega o bater das sete da noite. Escuridão total. A festa vai começar. 

(Continuação na próxima crónica: Viagem à Terra do Diabo - Parte 2)

Em terras do Diabo,

Hazel
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Rishikesh, a cidade dos gurus

Rishikesh, situada mesmo na base dos Himalayas, no Norte da Índia, é uma cidade Hindu sagrada com particularidades únicas e onde nos habituamos a um estado de surpresa permanente.

A nascente do Rio Ganges é muito perto daqui e as suas águas verde-esmeralda são ainda cristalinas e seguras para tomar banho, desde que com as devidas precauções — agarrar em cordas de protecção, manter-se sempre junto à margem e nunca tentar nadar — para não ser levado pela perigosa e fortíssima corrente.

Acreditam os Hindus que quem se banhar nas águas sagradas do Ganges limpa todos os seus pecados.

Vendedor ambulante que deambula junto ao Ganges. 

A alimentação é, por imposição legal e religiosa, completamente vegetariana. 
O consumo de animais e de álcool é proibido e não se encontra nos restaurantes. 

As especiarias estão sempre presentes na gastronomia de sabores intensos e estimulantes.








Ponte de Laxman Jhula, sobre o Rio Ganges.

Nas duas pontes oscilantes — mas seguras — sobre o Rio Ganges em Rishikesh, passam pessoas, vacas, burros e macacos, tudo-ao-mesmo-tempo. Para os Hindus, todos os animais são sagrados e circulam livremente, como se fossem humanos.

Os macacos, larápios velhacos, estão sempre atentos a uma oportunidade para furtar comida, óculos-escuros, máquinas fotográficas ou qualquer objecto pequeno que seja transportado de forma distraída.

Limpadores de Ouvidos (Hã?).

Estes dois amigos com bolas de algodão entaladas em cima das orelhas e maletas pretas, são "Limpadores de Ouvidos". Como o nome indica, limpam os ouvidos de quem quiser — sem garantia de não causar surdez permanente. Aqui está a solução para nunca mais ouvir conversas inconvenientes, estes senhores resolvem.

Vendedor de livros no mercado. 

Na Índia, falam-se vinte e três línguas e mais alguns dialectos não reconhecidos oficialmente. As duas línguas principais são o hindi e o inglês. 

Sumo de cana-de-açúcar com lima e hortelã espremido no momento. 

O mais delicioso e revigorante sumo que existe no mundo. Vale bem a pena arriscar uma hepatite B num copo mal lavado para degustar esta iguaria. Viver, por si, já é um risco. Por isso, eu alinhei em beber — e sobrevivi para contar a história.

Cortejo de Krishna.

Não existem passeios para os peões e todos circulam misturados: carros, pessoas, animais, carroças, motas e barcos. Todos sobrevivem, segundo parece. Tudo flui, de alguma forma misteriosa que não é para ser compreendida, mas para ser aceite.


As lojas de saris. 

Valha-me Maa Durga, a beleza e a exuberância das roupas femininas levam a mais espartana e indiferente mulher a perder-se em suspiros e devaneios mentais onde se imagina como personagem nos contos "As Mil e Uma Noites". 

Está claro que eu quis comprar todos os saris. Acabei por não comprar nenhum e agora vou arrepender-me para sempre. Buá!

Os colares de flores.

As flores são abundantes e de cores vibrantes, vendidas em colares para as celebrações Hindus junto ao Ganges.

Namasté.

As saudações mais usadas nesta região são "Namasté", "Areom" ou a colocação da mão sobre o peito enquanto sorrimos. 

As mulheres em Rishikesh.

Muitas mulheres indianas, nesta região, são mendigas ou trabalham na construção civil e a carregar pedras enormes sobre a cabeça. As condições em que vivem são extremamente duras para a sua constituição física frágil.

Nas lojas, casas de câmbio, cafés e restaurantes, táxis e tuk-tuks, quase só trabalham homens.

Os Sadhus.

Os gurus, líderes religiosos de barba e cabelos compridos, olhar compassivo e discurso lento e bem articulado, são prolíferos aqui. 

Em cada rua, tropeçamos num Sadhu, estes sábios prontos a revelar-nos os mais recônditos segredos da existência humana a troco de algumas rupias. 

As crianças.

As crianças que têm a sorte de poder estudar são alegres, simpáticas, felizes. 
Um privilégio que não está acessível a todas as famílias nesta região, pois muitas começam a trabalhar ou a viver como mendigos logo que aprendem a andar. 

A Índia é um país de contrastes: cheiro de incenso em todas as ruas, cores vibrantes, flores coloridas, vegetação luxuriante, animais em liberdade, misticismo, celebrações a acontecer diariamente, onde todos sorriem para todos e tudo sempre tem alguma solução improvisada. Como nos filmes de Bollywood, o impossível é sempre possível. 

Existe também a poluição, o lixo nas ruas, a exploração infantil e juvenil, os falsos gurus, os trapaceiros e o barulho a que nos habituamos e que nunca pára. 
O preconceito, o valor que atribuímos às aparências, a repulsa pela sujidade, o medo das doenças, a incapacidade de aceitar a desordem, o barulho e a imundície são colocados à prova diariamente.

Ama-se e odeia-se, na medida daquilo que nos encanta ou incomoda. Depende de onde o nosso olhar pousa e o coração repousa. Depende de quem somos, no fundo.

Contudo — por mim falo —, vence o Amor.
Espero voltar em breve.

O nosso regresso a Portugal esteve em risco; horas depois do avião aterrar, fecharam as fronteiras.
Felizmente, tudo correu bem e Portugal nunca me pareceu tão limpo, asséptico, ordenado e silencioso.

Termina aqui o Diário de Viagem. Muitas graças por me terem acompanhado.

Em quarentena,

Hazel
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Dharamsala, a cidade fora do tempo






Dharamsala, no Norte da Índia, é conhecida por ser a cidade onde reside o Dalai Lama. Mais especificamente, na pequena povoação chamada McLeod Ganj, nas encostas dos Himalayas.

É, dir-se-ia, um país dentro de outro país. A Índia desaparece neste pedaço do mapa, para que o Tibete se materialize aqui, totalmente intacto nos valores humanos, na compaixão, na inocência, na introspecção, na bonomia monástica.

Neste canto esquecido do mundo, o ar limpo e frio com aroma a gelo recém derretido e incenso de sândalo queima-nos as narinas que se dilatam nas muitas subidas íngremes, ladeadas pelas bandeiras de oração tibetanas que ondulam ao vento.

O tempo não existe. O passo lento e contemplativo dos monges pelas ruas; os cães que abocanham com satisfação um pedaço de comida acabado de oferecer; as saias compridas e sóbrias das mulheres tibetanas; os voluntariosos engraxadores de rua; o músico tragicómico que toca guitarra com bonecos presos por fios aos dedos. Tudo está cristalizado nesta dimensão paralela, repetindo-se em lemniscata.

Vemos o movimento dos ponteiros dos relógios, mas garanto que é uma ilusão.

As mais profundas aprendizagens espirituais foram, sem dúvida, pelo exemplo de dignidade e infinita bondade do povo tibetano, nesta povoação misteriosa que nos acolhe dando-nos a sensação de regressar a casa, mesmo que tenhamos nascido do outro lado do mundo.

Se alguém procurar a paz e não a conseguir encontrar dentro de si, talvez a possa redescobrir aqui, nas Rodas de Oração Tibetanas, nos cânticos dos monges e das monjas, no piar dos falcões em vôo planado entre as montanhas, no silêncio dos anciãos.


Na paz dos monges,

Hazel
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Happy Holi!




H
oje é o segundo dia da celebração do Holi, o festival Hindu das cores e da alegria.
O Holi Fest, como é conhecido, acontece anualmente por toda a Índia na Lua Cheia que ocorre entre o fim de Fevereiro e a primeira quinzena de Março.



Na noite anterior, queimam-se troncos de madeira empilhados verticalmente no centro das praças. Hoje o ritmo alegre da música Punjabi invade as ruas e enfeitiça-nos os sentidos. É impossível não nos deixarmos contagiar com tanta euforia, amor e união entre pessoas.



Ninguém escapa às cores vibrantes e perfumadas que nos são lançadas e espalhadas no rosto, cabelo e no corpo. O comércio encerra para que todos possam festejar, em absoluta igualdade e fraternidade.


O Holi Fest representa a celebração da chegada da Primavera e o triunfo da Luz sobre as Trevas, do Bem sobre o Mal. Todos os ressentimentos são limpos e a emoção que impera é de amor, sendo por isso também conhecido como o Festival do Amor.

Foi, sem dúvida, a celebração mais feliz e contagiante onde alguma vez estive. Com mil cores!

De alma garrida,

Hazel
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Gurdwara, o Templo dos Sikhs

A palavra “Sikh” significa “discípulo”. O Sikhismo é uma religião monoteísta.
Tradicionalmente, os homens não cortam o cabelo, que está sempre envolvido dentro de um turbante, nem a barba.


Para visitar o Templo Sikh tem de se cumprir algumas regras: cobrir a cabeça e os ombros, descalçar e passar por uma área com repuxos que lavam os pés. Os casais não podem beijar-se nem dar as mãos.

Uma parte muito importante do Templo Sikh é a enorme cozinha, onde todos trabalham voluntariamente. A compra dos ingredientes provém de donativos.



Na sala onde se partilham as refeições, que são gratuitas, todos se sentam no chão em estado de igualdade: ricos e pobres, analfabetos e cultos, mulheres e homens, novos e velhos.






Circula-se sempre no sentido horário e a música devocional, que é uma importante parte do culto, é uma constante agradável e hipnótica.

Não existem sacerdotes, como em outras religiões, mas existe alguém que vai gerindo as cerimónias e o Templo. As mulheres também podem oficiar cerimónias.

O celibato não é praticado. Nesta religião, a estrutura tradicional de família é fortemente apoiada. Os homens praticantes da religião Sikh adoptam o apelido Singh e as mulheres adoptam o apelido Kaur.

As bases desta filosofia foram influenciadas por homens santos dos ramos místicos Bhakti, do Hinduísmo, do Islão e Sufi.

De lenço na cabeça,

Hazel
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Aarti, a Cerimónia do Fogo na margem do Rio Ganges


Pela hora do pôr-do-Sol, o misticismo e o exotismo enfeitiçam-nos os sentidos, enquanto nos sentamos rendidos na margem do Rio Ganges para integrar o Aarti.

Aarti é uma cerimónia devocional Hindu onde se oferece luz às divindades e se fazem pedidos que são lançados ao rio. Acredita-se que os movimentos circulares realizados com o fogo trazem boa-aventurança e sorte, e que a luz afasta as trevas.

As oferendas incluem flores coloridas (representam o elemento Terra), água que é aspergida (elemento Água), uma lamparina com ghee ou óleo (elemento Fogo), leques de penas de pavão (elemento Ar), e incenso, que simboliza um estado de espírito puro.





Na margem do Rio Ganges,

Hazel
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