O Baile do Vento

sexta-feira, julho 15, 2016

foto: Christian Schloe
Dançam as árvores, os arbustos e as flores. Dançam os meus cabelos embaraçados e a ponta do meu vestido azul. Dançam as borboletas, mariposas, vespas, abelhas e libélulas. As bandeiras e as velas dos barcos. Dançam as ondas do mar que lambem a areia da praia. Dançam as agulhas de crochet com o fio de lã.

Dançam os pensamentos que voam alto onde encontram as aves de asas largas.
Abro os braços na imaginação e subo em espirais de ar quente como se o mundo estivesse de pernas para o ar e as sementes caíssem do chão para o céu.

Dançam as fadas, os silfos, as sílfides e os outros seres invisíveis. Dançam as penugens dos dentes-de-leão sobre os campos queimados pelo Sol. Dançam folhas secas, em fúria. Dançam gafanhotos apanhados de surpresa num salto. Dançam os sinos e os espanta-espíritos. Dançam cheiros, fumos, círculos de incenso, o vapor da cafeteira de chá a arrefecer no parapeito da janela.

Dançam as vozes, as gargalhadas, o choro e os suspiros. Dançam os moinhos, os cata-ventos e os galos nos campanários. Dançam teias-de-aranha que baloiçam para trás e para a frente. Dançam as cortinas nas janelas e as portadas de madeira que batem com força. Dançam as roupas lavadas penduradas no estendal que ganham vida quando o vento as veste umas a seguir às outras e as faz esbracejar.

Dança a areia do deserto e as moedas douradas que tilintam nos lenços de seda que cobrem o corpo sinuoso das odaliscas. Dançam bilhetes de amor roubados pelo vento antes de serem lidos. Dançam labaredas nas fogueiras de Verão que iluminam os corpos nus à sua volta. Dançam fitas coloridas que se entrelaçam em torno do mastro.

Dança a ponta do lápis sobre uma folha de papel branco, desenhando palavras que não servem para nada. Dançam as páginas do jornal, folheado pelo vento. Dançam as pontas das gravatas dos homens de negócios, sérios e circunspectos, incapazes de dançar. Dança a varinha de condão sobre os elixires perfumados. Dançam migalhas de pão sacudidas da toalha do pequeno-almoço, que os pardais depenicam.

Dançam papagaios de papel, koinoboris e bandeiras tibetanas que espalham preces de paz pelo mundo, levadas pelo vento que sabe ler em todas as línguas. Dançam as vagens das ervilhas nas plantações. Dançam as écharpes das senhoras elegantes.

Dançam as maminhas descaídas e os falos rodeados de floresta púbica na praia dos nudistas. Dança a chama da vela que tremeluz e dançam as sombras na parede. Dançam as cortinas do teatro a seguir às pancadas de Molière. Dança a vassoura que varre o lixo do chão e o das ideias. Dançam os fantasmas que se escondem nas portas e corredores. Dança a colher de pau que mexe a sopa de legumes. Falando nisso, vou parar de dançar para ir almoçar.

Num dia de vento quente,

Hazel

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