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O casamento da Elvira


Antigamente, namorava-se à janela. Ou por carta! O primeiro beijo dava-se de fugida, após longo tempo de namoro sempre sob o controle apertado dos mais velhos.

Que os vizinhos nunca o soubessem!
Depois de beijada, uma moça já não tinha o mesmo valor, pois já tinha "sido mexida".

Até que a mão da Elvira era pedida em casamento, sempre com grande formalismo.
O enxoval, reunido desde criança pela família, era lavado para tirar o cheiro da naftalina e preparado para a nova etapa da sua vida junto de um homem que, na realidade, mal conhecia.

Elvira ia nervosa com tantos olhares virados para si no grande dia e gelava de pânico com a perspectiva dos lençóis sujos de sangue que seriam orgulhosamente ostentados pela mãe às pessoas como prova da perda da sua virgindade na noite-de-núpcias (em último recurso, havia sempre o molho de tomate, conforme lhe tinham ensinado as amigas casadas, para safar-se das críticas das velhas alcoviteiras).

[Tudo isto era tão sério e tão pouco sexy]
Foi, como mandava a tradição, vestida de branco e com um bouquet de flores de laranjeira, símbolo de pureza e castidade.

Na realidade, as flores de laranjeira estavam ali com um propósito muito mais específico e útil do que apenas mostrar que Elvira era uma moça virgem.
O neroli, nome pelo qual é conhecida a laranja amarga, produz flores brancas (a flor de laranjeira) cujo perfume tem propriedades calmantes.

O objectivo das flores de laranjeira seria acalmar os nervos pré-noite-de-núpcias da pobre Elvira, que viria a divorciar-se anos depois, quando concluiu que afinal não tinha nada em comum com aquele rapaz com quem namorava à janela.
Bem, na realidade, até tinha: ambos gostavam de homens!

Hoje, a Elvira, senhora com mais de sessenta anos e de espírito de vinte, é activista dos direitos das mulheres, queimou o soutien na última manifestação e não perde oportunidade de viajar para destinos paradisíacos acompanhada das suas amigas tresloucadas.

O rapaz com quem namorava à janela, actualmente vive muito feliz com os seus três gatos e o seu companheiro, um enfermeiro mais jovem que conheceu quando colocou um piercing nas suas zonas privadas e correu mal. Auch!

Os poucos que restam vivos da família nunca lhes perdoaram tamanha devassidão!
E a laranjeira, que continua a dar flor, tem um lindo baloiço onde os netos da Elvira costumam brincar durante as férias de Verão.

NOTA: Esta história é pura ficção!

Beijos de neroli,

Hazel
Cronista, Viajante no Tempo, Terapeuta, Taróloga, Tradutora, Professora.

Comentários

Unknown disse…
pois ate pode ser ficção, mas é bonita e talvez mais verdadeira do que muitas outras!
beijinhos da costa alentejana, Xana
Unknown disse…
Ficção inspirada na mais pura realidade!
Beijitos
Paloma Cândida disse…
Gosto tanto de tuas histórias!!
*))
claudia disse…
Ficção, mas linda eu achei romantica.Quantas Elviras não existem por ai. Bjss Hazel
Anónimo disse…
Olá Hazel! Já me fez rir! Pura ficção mas ao mesmo tempo, muito real!Bjs

Sonia
Touka disse…
Adorei!

Beijinhos.
lidia disse…
Olá querida Hazel!Estás muito inspirada, há sempre muita verdade no que tu escreves , mesmo sendo para rir..
Tenho saudades, beijinhos para todos.Lídia
Lenora disse…
Espera lá. Eu tenho 63 anos e NUNCA NAMOREI NA JANELA. Aos 18 anos cursava a Universidade e frequentava barzinho e quejandos. Vivi o auge do movimento hippie e era livre, leve e solta. Feliz até a raiz dos cabelos e na minha época, já ninguém era obrigada a se casar virgem. Será que é porque sou brasileira?