A lira de Orfeu e a chuva de meteoros


As árvores debruçavam-se para escutar as melodias da lira de Orfeu, trazidas pelo vento.
Os pássaros suspendiam o vôo e os animais ferozes tornavam-se mansos, rendidos ao encantamento da sua música. As zangas eram apaziguadas.

Por amor, viajou até aos tenebrosos submundos, de onde ninguém conseguia regressar, para resgatar a sua amada e bela Eurídice, morta por uma serpente que se atravessou no seu caminho quando fugia da cobiça de Aristeu.

A viagem não teve sucesso. No último momento, desrespeitando a condição imposta por Hades, o senhor dos submundos, cede à tentação de olhar para Eurídice antes de alcançar o mundo superior, e perde-a. Orfeu regressa sozinho e desgostoso. Acabou por ser morto depois pelas Musas que desprezou por fidelidade e amor a Eurídice, vindo, assim, reunir-se à sua bela amada, perpetuando o amor além da vida.


A lira de Orfeu, após a sua morte, foi transportada por uma águia e colocada no céu, em forma de estrelas, que deu origem à Constelação de Lira. Uma vez por ano, em Abril, dão-se as Lirídeas, a chuva de meteoros na Constelação de Lira.

O céu chora as lágrimas de Orfeu sobre as nossas cabeças. Não de tristeza, mas de Amor.

Esta noite, vou olhar para o céu, pensar na lira mágica de Orfeu, símbolo do Amor que transpõe barreiras e vence sempre, e pedir um desejo. Por estarmos em Lua Minguante, sugiro que quem pedir desejos, os formule em sintonia com a energia lunar, pedindo que seja removido do seu caminho aquilo que impede a concretização de... (o vosso desejo)

Este post foi escrito embalado pelo som da lira grega neste vídeo:


A olhar para o céu,

Hazel

Vizinhos, essa espécie em vias de extinção


Sou de um tempo em que a chave da porta da rua ficava quase sempre pendurada do lado de fora. Só tocava à campainha quem era 'de fora', os vendedores de enciclopédias, as beatas a pedir quinquilharia para a quermesse. As vizinhas sabiam que não era preciso bater, chegava até a ser despropositado cumprir tal formalidade.

Entrava-se sem cerimónias para pedir um molho de coentros, uns limões, oferecer um saco cheio de figos acabados de colher, partilhar revistas de moda e de conselhos femininos, ou trocar dois dedos de conversa sobre a vida alheia e os dilemas da educação dos filhos.
Tudo enquanto se tiravam as favas das vagens, se descascavam batatas para o almoço ou descosiam os alinhavos da bainha de uma saia.

O tempo arrastava-se devagar. Era um tempo mais longo. Havia sempre o que fazer, mas havia sempre tempo para tudo. As tardes esticavam até se perderem de vista no horizonte.

Hoje, já adulta, entro no prédio onde moro, vejo se há correio e subo as escadas de pedra fria onde raramente encontro alguém. As pessoas esperam até ouvir uma porta bater para abrirem a porta das suas próprias casas e assim saírem sem ter de passar pela maçada/obrigação de cumprimentar.

É reconfortante ouvir os pratos dos vizinhos do lado a baterem no lava-loiças depois do almoço e a torneira a abrir e fechar. Os lençóis floridos da vizinha de cima, que me tapam tantas vezes as janelas, e eu nunca tenho coragem de reclamar, porque são tão acolhedores e primaveris, que preferia perguntar em que loja os comprou a queixar-me. É praticamente todo o contacto humano que existe.

Sinto falta de ter vizinhos que me perguntem se posso dispensar algumas batatas porque o supermercado já está fechado, ou a quem eu possa pedir um ramo de salsa.
Que me avisem "Ó vizinha, vem lá chuvaaaa!", para eu tirar a roupa do estendal a tempo.
Ou que me peçam para lhes regar as plantas quando vão de férias.

No ano passado, mesmo sem conhecer os meus vizinhos, pendurei nos puxadores das suas portas um pequeno saco com frutos secos e um postal de Natal "Votos de Boas Festas dos vizinhos do 1º Esquerdo!" A vizinha da frente veio bater à minha porta uns dias depois e ofereceu-me um bloco de apontamentos com desenhos de girassóis. Depois mudou de casa.

Há dias, esqueci-me da chave de casa pendurada do lado de fora da porta. O vizinho de cima tocou à minha campainha: "Cuidado, olhe que se esqueceu da chave cá fora", e desapareceu num ápice, sem chegar a ouvir o meu agradecimento.

Oh, que nostalgia.

Hazel

Gostos e desgostos


Ao longo da vida, houve pessoas que gostaram dela. Poucos, muito. Muitos, mais ou menos.
Houve também outros que nunca gostaram dela, porque ela não era como eles queriam. Ou só porque existia.

Outros ainda, deixaram de gostar, porque ela nunca se tornou no que eles queriam que se tornasse.

Até ela, tempos houve em que quase deixou de gostar de si mesma porque aqueles de quem gostava não gostavam de si. Então, esses passaram a gostar ainda menos dela.

Mas ela não poderia deixar de ser quem era para tornar-se algo que não era, e assim esperar que os outros já gostassem de si. Os outros gostariam de alguém que, na verdade, não existia e de quem ela não iria gostar porque estaria a enganar-se a si mesma. Não podia ser assim.

Ela é que tinha de gostar de si mesma.
Os outros não tinham essa obrigação, mas ela tinha. Apenas ela.
E, assim, começou a gostar muito de si mesma, sem pensar em mais nada.
Então, vieram outros que seguiram o exemplo, e gostaram dela, para sua surpresa.

Os que antes não gostavam, dividiram-se. Uns, passaram a gostar ainda menos.
Outros, passaram a gostar para ver o que poderiam ganhar em troca.

Ela continuou a gostar de si mesma, indiferente a todos.
E vieram cada vez mais pessoas a gostar dela.
Mas ela não se deixava influenciar, nem pelos que gostavam, nem pelos que não gostavam, nem pelos que tinham passado a gostar por conveniência.
Ela gostava de si mesma sempre da mesma maneira, sem nunca mais voltar atrás.

E é assim que está certo.

Quatro mudas de roupa

Existe uma pessoa que viaja permanentemente pelo mundo com uma mala apenas. 
Não tem casa. A sua casa é o mundo. Por onde passa, deixa um rasto de encanto e magia. A sua leveza e serenidade apaixona homens e mulheres. 

Na mala, transporta 4 mudas de roupa completas, além dos seus amuletos e talismãs. 
É praticamente tudo o que tem, esta pessoa que viaja levada pelo vento.

Até parece que estou a descrever uma personagem inventada, mas é uma pessoa real. Escolhi omitir o seu nome; se alguém adivinhar quem é, não confirmo nem desminto!

Não me sai da cabeça que aquela pessoa só possui 4 mudas de roupa.
Sempre que abro o roupeiro, lembro-me que é possível viver apenas com 4 mudas de roupa -  as nossas roupas preferidas.

Pode-se combinar e alternar as peças umas com as outras, e vestir apenas aquilo de que gostamos mesmo. Afinal... [ler devagarinho]  q u e m   é   q u e   é   d e   q u e m ?
São as roupas que são nossas, ou nós que somos das roupas?

É apenas roupa, podem pensar. Mas as roupas interferem com o nosso estado de espírito, podem fazer-nos sentir confiantes ou deprimidos.

Desde que ando a pensar nisto, ao longo dos últimos meses, as minhas 2 gavetas de roupa ficaram com o volume pela metade, a ponto de estar quase a poder juntar tudo numa só gaveta. E o roupeiro ganhou mais oxigénio no intervalo entre cabides.

O mais importante da vida não são as roupas que usamos, mas a vida que vivemos.
Para quê 15 pares de sapatos? Temos 2 pés, ou somos uma centopeia?

Virada do avesso,

Ritual nocturno para cabelos longos e saudáveis

Os supermercados estão repletos de produtos para os cabelos, mas, ainda assim, continuo a ter uma predilecção pela simplicidade nos cuidados capilares. Para quê complicações, hã?

Um ritual simples (e económico!) que tenho para manter as pontas dos cabelos hidratadas e macias é molhar os dedos em óleo e passá-los nas pontas dos cabelos à noite, antes de dormir. Basta duas ou três gotinhas!
E só nas pontas!

Mas que tipo de óleo, Hazel?, vós perguntais.

Óleo de massagens. De qualquer marca, desde que seja natural, sem aditivos sintéticos.

Os óleos de massagens são hidratantes e, se são bons para a pele, são bons também para o cabelo.

Pela manhã, o óleo terá sido completamente absorvido pelo cabelo, o que facilita depois a escovagem e permite que dominem o animal selvagem capilar. Aha!

Hidratada e maravilhosa,

Hazel