O manto escorregou-lhe ao longo das costas nuas em direcção ao chão, no entanto, parece continuar sobre a pele. Quase se poderia contar o ar partícula a partícula.
A electricidade no ambiente parece antecipar a chegada de uma trovoada.
Os seus pés caminham através das lajes pretas e brancas, como uma peça de xadrez que desliza ao longo do tabuleiro. Silencioso e inexorável como a Torre e, contudo, directo e fatal como a Rainha.
O som oco do bambu toca a melodia ordenada pelo vento seco que se esgueira por uma janela no extremo oposto, entrecortado por cortinas pesadas de veludo cor-de-sangue, que se movem subtilmente ― revelando fantasmagóricas formas femininas que dançam à sua passagem.
Toda a sala parece um útero profundo, macio e enigmático, que aguarda a sua chegada com a inevitabilidade de uma profecia. O fumo do incenso eleva-se, entontecendo-o, embriagando-o. A visão estende-se em flashes, estranhamente sincronizadas com o pulsar do sangue nas veias dilatadas pela excitação.
Através das cortinas de fumo revela-se o corpo de uma mulher, que se move de forma sinuosa como uma serpente, dançando lentamente ao ritmo dos bambus.
A Deusa. Aquela que Tudo Vê. Inspira profundamente, capaz de sacrificar a própria vida para poder eternizar o momento. De matar ou de morrer.
Engoliu sem ter saliva, enquanto uma gota salgada de suor escorre pelas têmporas.
Os olhos ardem e desfocam-se numa névoa. Absolutamente rendido, o corpo nu, transpirado, a latejar de desejo, incapaz de pensar com clareza.
Talvez seja um sonho, uma alucinação, uma obsessão que foi longe demais. Os cabelos longos e ondulados da mulher beijam-lhe provocadoramente os seios como serpentes vivas, lânguidas e famintas.
Desloca-se sem hesitar, movido pelo desejo que não se consegue conter e nos leva a saltar, não se sabe se para o céu, se para o abismo. É na loucura que está a razão.
Beija com devoção os seus pés brancos de flor de lótus. Os olhos de ágata-de-fogo aprisionam-no num transe hipnótico. Entrega-se.
Sente-se asfixiar, enquanto o prazer lhe invade o corpo; enquanto a serpente o devora. O seu sibilar penetra-lhe os ouvidos como uma corrente eléctrica. Nada mais importa. Aqui está Tudo. O Alfa e o Ómega. A Grande Iniciação.
Gradualmente, todos os seus dedos foram sendo sugados, os lóbulos das orelhas, o pescoço, os mamilos, o sexo, a ponta da língua. Tudo ficou completamente escuro.
...
Acordou com os lençóis enrolados à volta das pernas. Senta-se na beira da cama, confuso. Teria sido tudo um sonho?
O coração disparou quando olhou para baixo e se depara com uma pequena tatuagem de serpente que apareceu misteriosamente no interior da coxa esquerda.
Sob os auspícios da Ssssserpente,
Hazel
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