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Pelas ruas do meu bairro



Ainda eu usava totós com laçarotes de cetim e meias de renda branca até aos joelhos, e já a Drogaria Costa, no Largo de S. Domingos de Rana, era antiga.

Foram muitas as vezes que ali fui, pela mão da minha mãe, para comprar uma vassoura, um escorredor, um globo de vidro para o candeeiro da sala, querosene, parafusos, ou qualquer outra utilidade doméstica.

Ali havia de tudo, e as pessoas tantas vezes chegavam a fazer fila até à rua. Nesse tempo, ainda não existiam as "lojas dos chineses", nem o Leroy Merlin.


Os anos passaram e quase todo o comércio tradicional foi, aos poucos, desaparecendo como pó numa tarde de vento quente. Excepto esta loja, a mais antiga da localidade. E, quanto a mim, a mais especial.


Hoje precisei de comprar um insecticida para os tapetes (que o meu gato tem andado pulguento!), e resolvi ir lá.

Enchi-me de coragem, venci a timidez e, depois de pagar a minha conta, pedi autorização à senhora para fotografar a sua Drogaria.

Conhecendo-a de vista praticamente desde que nasci, apercebi-me de que só hoje, pela primeira vez, perguntei o seu nome.

A Dona Irides, 76 anos, não queria ser fotografada. Esta senhora, que percebe de torneiras, parafusos, decapantes, tintas, ceras, e toda a parafernália que se possa imaginar numa drogaria, no fundo, é a alma deste lugar. É dela que provém todo o encanto, toda a magia.

Por isso, correndo o risco de ser chata, insisti. Aceitou uma fotografia acompanhada pela sua filha Paula, enquanto conversámos sobre os velhos tempos.



A Drogaria já existia antes de ter sido comprada pela Dona Irides e o seu (já falecido) marido. Desde há 40 anos que esta senhora, bem-disposta e com um sorriso, atende os pedidos de quem lá vai, tendo sempre um conselho útil a dar.


Enquanto as suas sábias mãos me mostravam como se monta uma ratoeira, explicava de que forma os ratos mais espertalhões, depois de roubarem o tentador pedaço de queijo, conseguem escapar.


A sua filha Paula, de 40 anos, a mesma idade da Drogaria Costa, contou-me que sabe tocar piano e, com a genuína doçura e ternura de uma criança, perguntou se me podia dar um beijo.
Claro que sim!



Estas paredes contam histórias de um tempo em que havia menos de tudo. Menos lojas grandes, menos canais de televisão, menos aparelhos electrónicos. Mas, em compensação, havia mais simplicidade, mais olhos-nos-olhos, mais calor humano.

A Drogaria Costa não tem página de internet. Por isso, fui lá directamente, à boa maneira tradicional. Cheguei lá, olhei nos olhos das pessoas e disse que gosto deste sítio, e que é especial para mim! Assim mesmo.




Obrigada, Dona Irides!
Obrigada, Paula!

Dentro da máquina do tempo,

Hazel
Cronista, Viajante no Tempo, Terapeuta, Taróloga, Tradutora, Professora.

Comentários

Patricia Abreu Tiago disse…
Como me lembro... Lembro me igualmente de subir a ladeira do Bairro de Sete Castelos para o centro de S Domingos de Rana, pela mão da minha mãe. Passar junto ao portão da creche do Centro Paroquial e olhar para as crianças que ali bricavam como se pedisse para ir brincar com elas., Queria fazer rolar pneus e subir o portão como se de um espaldar se trata se. Íamos á drogaria., Nesse mesmo largo da dogaria existia uma padaria e por vezes a minha mãe comprava carcaças. Também eu usava meias de renda brancas e totós! Quem sabe se não chegámos a ir junta pelas mãos das nossas mães que eram amigas?!!!!
Zwatt disse…
Obrigado, Hazel. No final humedeceste os meus olhos. Lindo