Intrigam-me as pessoas caladas. Há um inegável respeito que impõem no seu jeito silencioso de existir e no olhar observador com que seguem as conversas acenando educadamente com a cabeça, mas guardando as suas opiniões para si, seja por timidez, precaução, ou pela irrelevância que possam atribuir às palavras. Se a paz de espírito pertencer a alguém, nunca poderá ser de um tagarela.
E eu, que tantas vezes me arrependo por colher maçãs antes de me certificar que estão maduras, falando por impulso sem antes medir as palavras, admiro quem dá primazia aos pensamentos em relação ao verbo. Afinal, o mundo já tem palavras demais à solta, palavras que por vezes se descontrolam e geram zangas, mal entendidos, conflitos, ressentimentos, guerras.
Já o silêncio é tão raro e valioso que não sabemos como comportar-nos quando desavisadamente nos encontramos a partilhá-lo com alguém durante mais de cinco minutos.
De certa forma, sentimo-nos nus, pretendendo simular naturalidade, mas sem saber o que fazer com as mãos que procuramos desajeitadamente enfiar nos bolsos que não temos e, por isso, socorremo-nos de uma manta que nos cubra a aflição da vulnerabilidade - a palavra. Cometemos, assim, a grosseria de invadir a perfeição silenciosa do universo da outra pessoa com uma qualquer observação banal e cretina sobre o tempo ou sobre como correu a semana.
As pessoas caladas têm um universo mais vasto que as outras, com mais continentes, oceanos, ilhas, estações espaciais, estrelas e nebulosas. É interessante observar o contraste dos que falam sem parar, como se da sua boca saltassem milhares de massinhas da sopa de letras entrecortadas por breves segundos de pausa para ganhar fôlego; por oposição à serenidade dos que observam o mundo sem sentir necessidade de lhe acrescentar uma sílaba.
O silêncio é uma arte que apenas podemos apreciar emoldurada pelos barulhos do mundo.
Não podemos - nem devemos - querer silenciar os ruídos à nossa volta. É o nosso silêncio interior que se deve sobrepor aos barulhos exteriores. Só então dominaremos essa arte e estaremos aptos a ter longas conversas com um simples aceno de cabeça. Como a Patrícia.
Esta semana, a carta O Eremita inspira-nos a privilegiar o silêncio e desafia-nos a encontrá-lo dentro de nós. Mergulhemos nas suas profundezas, escutemos as suas respostas e troquemos o ruído dos nossos passos apressados pelo deslizar harmonioso de uma existência quase não-existente, tamanha a sua harmonia com o pulsar da Terra.
Hazel
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